USP cria tecnologia que reduz tempo sem energia em caso de falhas na rede elétrica
Para reduzir o prazo desse incômodo período sem energia que pode gerar diversos impactos socioeconômicos e multas para as concessionárias
Quem nunca passou por algum transtorno em casa quando a energia elétrica é interrompida depois de uma tempestade afetar as redes que alimentam nosso lar? Geralmente, o que fazemos em uma situação como essa é solicitar os reparos à companhia responsável pelo fornecimento de energia, mas, dependendo da gravidade do problema, o tempo de conserto pode ser grande.
Para reduzir o prazo desse incômodo período sem energia que pode gerar diversos impactos socioeconômicos e multas para as concessionárias, pesquisadores da Escola de Engenharia de São Carlos (EESC) da USP desenvolveram um sistema que utiliza inteligência artificial para otimizar os serviços de manutenção da rede afetada, auxiliando os operadores das distribuidoras de energia na tomada de decisão mais rápida. Parte da tecnologia, capaz de diminuir em até 20% o tempo para execução dos reparos, já está sendo adotada pela Companhia Paranaense de Energia (COPEL).
O trabalho foi publicado pelo Instituto internacional “IEEE”, durante a 2022 IEEE International Systems Conference (SysCon). Por meio do desenvolvimento de alguns algoritmos – códigos de computador que executam determinada tarefa -, os cientistas propuseram um software que leva em conta diferentes informações para determinar qual a forma mais eficiente de resolver o problema. Durante a avaliação, o programa de computador considera as condições meteorológicas das localidades, a posição de origem das equipes de manutenção, o estado e o nível de congestionamento das estradas e vias utilizadas para locomoção, identificando possíveis obstruções, além do histórico de reparos e problemas ocorridos anteriormente. A tecnologia, que levou cerca de cinco anos para ser desenvolvida, utiliza até mesmo um sistema da Nasa para ajudar nas estimativas das condições climáticas.
“Não existia um algoritmo capaz de reunir todos esses dados, interpretá-los e transformá-los em uma informação útil, mastigada, traduzida e em tempo real para o operador, que pode ser iniciante na função. Muitas vezes, o profissional precisa tomar uma decisão rápida, mas com tantas variáveis, ele não consegue interpretá-las no tempo necessário e acaba seguindo uma estratégia padrão, que pode não ser a mais eficaz para resolver o problema. Por isso é importante termos diferentes fontes de informação para agilizar o conserto e até prever uma possível falha para que, caso ela realmente aconteça, a energia retorne o mais rápido possível. Nosso sistema será o braço direito do operador”, afirma Henrique de Oliveira Caetano, doutorando do Programa de Pós-Graduação em Engenharia Elétrica da EESC e um dos autores do estudo.
Histórico em jogo – Falhas no sistema de distribuição de energia elétrica podem ocorrer por diversos motivos, entre eles, fatores operacionais, falhas de equipamentos ou então serem provocadas por problemas externos, como ataques cibernéticos e eventos atmosféricos extremos. Conhecer o histórico dessas ocorrências pode ajudar a agilizar os reparos feitos pelas equipes técnicas.
“Nosso algoritmos analisam informações relacionadas à falhas e acidentes ocorridos anteriormente em determinada região a fim de propor a melhor solução para a ocorrência que está sendo atendida e para outras que poderão ocorrer no futuro. O sistema consegue avaliar as regiões que são mais suscetíveis a alagamentos, os equipamentos ou locais que mais apresentam falhas, quais são os problemas mais recorrentes, entre outros. Com esses dados, sabendo com antecedência que haverá uma tempestade, por exemplo, podemos até mesmo deslocar equipes para posições estratégicas antes que uma falha ocorra, otimizando ainda mais a manutenção e reduzindo o valor das multas para a concessionária”, explica Matheus Fogliatto, doutorando em Engenharia Elétrica da EESC e um dos autores da pesquisa.
Quanto às rotas traçadas pelo novo software para guiar as equipes de manutenção até os locais onde os problemas ocorreram, os algoritmos foram customizados com o objetivo de deixar as pessoas o menor tempo possível sem energia. Por isso, os códigos definem o melhor trajeto com base nos reparos necessários para a solução das falhas, diferenciando-se dos aplicativos convencionais de GPS.
“Basicamente, os apps de mapas utilizados hoje em dia traçam rotas considerando apenas dois pontos, o de origem e o do destino final, indicando o caminho mais rápido para uma simples locomoção. No entanto, no caso do conserto de uma rede elétrica o cenário é diferente porque, muitas vezes, as inspeções precisam ser feitas em mais de um ponto da rede, em diferentes localidades. Isso é exatamente o que nossos algoritmos consideram na hora de calcular as rotas, pois talvez seja preciso parar em algum ponto específico para reparos adicionais”, explica Luiz Desuó Neto, doutorando em Engenharia Elétrica da EESC e também autor do artigo.
Testes – Para validar a tecnologia, os cientistas realizaram diversos testes com programas de computador que simulam diferentes cenários da realidade de um sistema de distribuição de energia, as possíveis falhas que podem ocorrer, variáveis atmosféricas, histórico, além do prazo estimado para reparo de cada problema, buscando sempre reduzir os prejuízos tanto de quem fica sem energia como os da concessionária.
Considerando o tempo padrão necessário para conserto de problemas corriqueiros, foi possível diminuir cerca de 20% o tempo sem energia utilizando a tecnologia. Para o professor do Departamento de Engenharia Elétrica e de Computação (SEL) da EESC, Carlos Maciel, que orienta os doutorandos envolvidos no trabalho, um dos destaques do estudo é a capacidade do software de unir e realizar a fusão de diferentes fontes de informação, proporcionando decisões mais ágeis e precisas por parte dos operadores.
“Do ponto de vista do cliente, é menos tempo sem energia, enquanto aos olhos da concessionária, serão multas bem menores a pagar. Os sistemas de distribuição de energia elétrica vão falhar, isso é algo inevitável, por mais que a tecnologia dos equipamentos esteja evoluindo nos últimos anos. Então, nós temos que desenvolver estratégias para melhorar e acelerar a recuperação das redes”, finaliza o docente, que coordena o Laboratório de Processamento de Sinais (LPS) do SEL, onde o estudo foi desenvolvido.
O trabalho, que também teve a participação do ex-aluno da EESC Rodrigo Fanucchi, contou com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), por meio do INCT-SAC, sediado na EESC.